domingo, 24 de setembro de 2023

Perdida no oceano




 Não sei como aconteceu mas cheguei a NY!

Perdi-me no alto mar e atravessei o Atlântico denso, frio, profundo e até perigoso!

Parti de Portugal, num dia de Agosto da praia de Lavadores, o mar estava bravo e os meus donos não me conseguiram salvar, eles viam-me nas cristas das ondas sem poderem fazer nada e a minha “gémea esquerda” corria em clara aflição de um lado para outro na esperança de eu voltar à praia, atirada por uma onda. 

Foi um ai jesus de "vem onda, leva-me para a praia" não posso viver sem a minha gémea. 

Frustrada não consegui! 

E agora!? Que vou fazer nesta imensidão de água? Chorei todas as missangas que tinha e flutuei sempre na superfície pois não tinha força para mergulhar.

Alguns peixes ainda vieram ter comigo para ajudar, me consolar nesta minha tristeza, as missangas só brotavam como um choro dilacerante…e todas foram para as profundezas do oceano…

Espero que nenhum peixe se entale com elas!, pensei eu

 Meus Deus, estou a sujar, a poluir a casa deles! Pensava eu aflita… mas que podia fazer!? Alguns bocados do meu corpo frágil foram bruscamente fragmentados em pedaços pequeninos que ficaram a boiar.

Talvez vão ficar assim por séculos…

Mas de certeza que os meus donos não fizeram isto, não me abandonaram, de propósito…. Foi uma onda mais forte que me arrastou…

Pelo caminho no Atlântico, encontrei simpatia em algumas algas que me aconchegaram, alguns peixes brincaram comigo atirando-me ao ar, outros, menos atenciosos, trincaram meus calcanhares, magoando-me e fazendo perder meu corpo delicado.

Houve um dia que um barco passou por perto e uma criança ainda pegou em mim e brincou nas bordas do barco como se eu fosse um carrinho, a mãe chegou perto e bruscamente me atirou borda fora dizendo ao menino “é caca… é caca”… ao menos podia-me ter posto em lugar seguro, tipo, num saco…

Enfim…. Vida de fugitivo em maré alta!

Não era assim que eu queria vir a NY, sozinha e literalmente despedaçada.

Ó se a minha “gémea esquerda” estivesse aqui comigo, virávamos esta cidade em alegre correria…

Estou a sentir alguma coisa! O que é isto!? Alguém pegou em mim, para onde me levam, estou a sufocar…. À minha volta eram cordas, sacos, caixas, latas, frascos, madeiras podres, uma porcaria toda junta… Mas eu sou uma princesa, tinha missangas nas minhas vestes, não posso ser tratada assim como uma qualquer

Foi curta a minha passagem por NY…

Por favor digam à minha “gémea esquerda” que eu estou aqui, de certeza que me vem buscar!...

Não ligaram nenhum ao meu apelo! 

Mas a “gémea esquerda” chorou naquele fatídico dia, olhou para o oceano com esperança

Ficou certo tempo espetada no desenrolar das ondas… Mas nada!...a “gémea direita” não voltou!

Voltou á praia pelo pé da dona com uma réstea  de esperança do regresso, ou mesmo que alguém a tenha encontrado abandonada

Os dias passaram numa triste solidão, num desses dias foi metida num saco, nunca mais se ouviu falar dela.

Penso até que virou lixo e foi para a reciclagem.

(esta é a triste história de um chinelo de praia) 

1 comentário:

  1. Já me fartei de rir!!!🤣🤣🤣 Triste fim, para um chinelo com tantas aventuras para contar!!!😍😍😍

    A tua mana Maria Oswalda

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