domingo, 4 de abril de 2021

Páscoa na aldeia


A Páscoa na aldeia

“Ouves o sino?... que horas são? Ainda é tão cedo!

O compasso já está perto!"

O sino tocava tlim tlom… tlim tlom… a avisar que o Senhor estava a chegar à nossa casa!

"Meninos venham… despachem-se….”

 Ouvia-se o estalar de fogo como que a anunciar que acabou de sair de uma casa que ficou cheia de alegria e vida.

Já os vejo à entrada onde o chão devidamente decorada com flores para anunciar que sim… o Senhor pode entrar na nossa casa….

Nós, esperávamos ao cimo da escadaria pela chegada, eles vinham apressados e suados, e lá subiam de capas esvoaçantes vermelhas, um com o sino, outro com a água benta e ainda outro com a pasta para guardar as ofertas e por fim a cruz.

Ao entrar na sala diziam umas palavras abençoadas, molhavam-nos com a água benta e o meu pai a quem era entregue a cruz nos dava a beijar os pés do Senhor (era a parte que eu menos gostava, peço desculpa, mas muitas vezes fiz de conta que beijei)

Na mesa da sala estava um banquete de amêndoas, bolos, bolachas e vinhos para os receber… uma almofada era colocada no aparador para o Senhor descansar enquanto os mensageiros degustavam …

 Eu o Vasco esperávamos ansiosos que eles fossem embora para podermos “atacar” as doçarias que sobraram na mesa… eles desciam aquela escadaria apressados, creio que já um bocadinho “tocados” com o álcool da manhã mas firmes e já com o sino a tocar… são do campo! Estão habituados!

Ao descer a escadaria as capas esvoaçantes ficavam para trás como que fossem voar (mais tarde, já com a minha filha eu dizia que eram os “super-homens”) até à próxima casa…

A seguir o cabrito que já estava temperado de véspera pela nossa mãe era levado a casa do Sr Adão para assar no forno do pão, assim como o arroz. Ainda hoje sinto aquele sabor, esse sim, abençoado… era tão bom!!!!

Lembro-me que eram três dias fantásticos, matávamos saudades dos nossos amigos das férias, eram dias de liberdade com cheiro a pinheiro e rio Douro….

Quando estava calor até pareciam as férias de verão, era tanta a brincadeira! 

No sábado de Páscoa o nosso irmão Rui ia lá sempre passar o dia…acho que nunca falhou um, desde pequena que me lembro da Páscoa na aldeia, talvez por isso seja uma festa que na cidade não tem magia. Mais tarde, já casada e com filha, continuamos a ir com os meus pais e o Vasco

A Inês não gostava nada do fogo, fugia a sete pés e subia por mim acima sempre que o ouvia!

Três dias de pura contemplação!

Três dias de reflexão!

Três dias de repor energias!

Três dias de passeios… houve uma Páscoa que nevou e fomos com os pais à serra de Montemuro, saímos para brincar na neve com a Inês, quando olho para trás estava o meu pai a enterrar os pés na neve todo contente, como uma criança, porque nunca o tinha feito ou sentido o prazer da neve, foi uma risota… parecíamos todos umas crianças a atirar bolas de neve, o Fausto para delicia da Inês pôs uma bom bocado de neve no carro que ao descer a montanha ia derretendo…

Tantas histórias… tantos cheiros… tantas saudades…

Era assim a Páscoa na “minha aldeia”

 

  

Sem comentários:

Enviar um comentário